sexta-feira, agosto 29, 2008

CHIQUINHO

Vovó gostava de criar filhotes de pássaros em casa para domesticá-los. Cuidava dos filhotes ainda sem penas com papa de fubá e de frutas.
Lembro ainda dos filhotes de maritacas, de pássaros pretos e canários da terra que ela criava com todo carinho dentro de casa.

Mas de um lembro em especial, um pássaro preto que foi batizado de Chiquinho!

Foi pego ainda bem novinho, e tratado com muito carinho e cuidado.

Cresceu e acostumou com todas as pessoas da família!
Ele possuía uma gaiola que ficava pendurada na sala, onde ele dormia e ficava. Mas a gaiola estava sempre com a porta aberta para que ele saísse quando quisesse.

Ele gostava de voar para o ombro de alguém e pedir carinho, abaixava a cabeça esperando um cafuné!
Ah como ele gostava que coçasse a sua cabeça!
Estava sempre feliz a cantar e quando queria algo dava aquele piado que todos sabiam interpretar.

Costumava voar até alguma árvore próxima, ir até o pomar e depois retornava para a sua gaiola.
Cantava um canto alegre e firme e era um encanto, uma euforia só!
Incrível, atendia sempre que ouvia seu nome, sabia que ele era o Chiquinho! Acreditem!
Certo dia apareceu pela fazenda, de passagem, um caixeiro viajante, um viajante que trazia produtos da cidade grande para vender.

Vovó interessou-se pelos tecidos e permitiu que ele entrasse até a sala e mostrasse o que havia de novidade.

Logo foi dizendo:

- Ah que pássaro lindo!

- E ele não foge, com esta portinha aberta?

- Não - respondeu vovó – ele foi acostumado a viver em liberdade.

Mas algo estranho começou a acontecer!

Chiquinho que era um pássaro alegre, calmo e manso começou a demonstrar um comportamento estranho!

Saltava de poleiro em poleiro e soltando alguns piados tristes!

Algo não estava normal todos perceberam.

Assim que aquele estranho se foi vovó apressou-se a pedir que eu fosse correndo chamar a Mariana.
Como já era de costume quando alguém adoecia mesmo um animal da fazenda Mariana era solicitada para vir benzer.
Em pouco tempo cheguei pouco a frente da Mariana que veio já preparada com um galho de arruda e pegando o pássaro no colo passou ao ritual de benzedura aspergindo água com aquele ramo de arruda e balbuciando algumas palavras que não podia entender.

Chiquinho estava quase paralisado, sem ação, não era mais aquele pássaro alegre e esperto que conhecíamos!

Mariana disse:

- “Cumade Nita”, a coisa tava feia, este homem botou um mal olhado muito brabo nele!
- Coisa pesada, mas ele vai ficar bom, deixa ele ai na gaiola e vai ver amanha ele vai estar bom de novo!

Eu que estava lá de pé encostado na porta observando atento todo o ritual apressei a sair e aproveitar o resto da tardezinha que terminava para brincar, correr lá pelo pomar.
Sei que Mariana, uma negra empregada antiga da família ficou ainda um pouco conversando com vovó e vi quando ela passou na estrada e disse:

- “Inté Adarto!”

Ai disse também o “inté” e continuei a brinca!

Só sei que no dia seguinte ao levantar encontrei o Chiquinho todo serelepe a saltitar e já arriscando algum canto afinando suas cordas vocais..

(Tudo aconteceu na minha infância na fazenda de meus avós, em Minas Gerais, por volta de 1955)

Gnomos ou Duendes?

Uma visita inesperada.

Lá fora o céu estava azul, o sol brilhando, a metade do quarteirão onde morava ainda era coberta por arbustos e vegetação rasteira que estava a anunciar a primavera.

Eu havia acabado de chegar e já estava na mesa para almoçar.
Surpreso observei a minha frente diante da mesa dois seres muito alegres, mas um tanto diferente, um pouco disformes em relação aos humanos. Estavam falando entre si e me fitando, eu surpreso fiquei sem ação.
Apenas perguntei a mulher que estava lá na pia preparando alguma mistura.

- Olha, você está vendo?

- O quê? Não vejo nada, ta doido?

- Há dois homenzinhos a minha frente.

- Imaginação sua, não há ninguém ai.

Neste ínterim percebi que eles ficaram pensativos um olhando para o outro e depois como duas crianças alegres começaram a saltitar e a desmanchar em gargalhadas.
Em seguida, dirigiram-se à porta e sumiram através do mato ao lado da casa.
Mas realmente eles estavam ali embora visse que eles conversavam entre si eu não os podia ouvir, apenas vê-los!
Alguns anos já se passaram desde este encontro porém permanece nas minhas lembranças a imagem daqueles dois seres que embora diferente de nós humanos eram muito semelhantes e transmitiam muita paz e bondade.
Não mais os vi em lugar algum, mas a sua presença ainda sinto em alguns lugares que passo ou em minha própria casa!

Gnomos, Duendes, Fadas, e outros seres elementares existem de verdade!?

Depois daquela experiência eu acredito, eu os vi, eu os sinto!

Acredito que haja uma há outra dimensão paralela a nossa! Muito próxima, mas que apenas algumas pessoas percebem!
Estes seres, embora não os vemos podemos sentir a presença deles muitas vezes bem ao nosso lado, eu... eu os sinto!

sábado, agosto 23, 2008

O tronco de Ipê

Foto do casarão, o Ipê não aparece ai, esta é
visão que se tinha lá debaixo da árvore, junto
a porteira

Era lindo, robusto, frondoso e estavam enraizadas bem em frente ao casarão, as margens da estrada que trazia os viajantes, os caminhantes, as comitiva que retornavam conduzindo centenas de cabeças de gado.
Em seu tronco estava a base de uma porteira que separava as duas pastagens, a do leste que tinha como cenário de fundo o morro da onça e a do oeste, aos fundos da fazenda, a estrada dos Maias que cortava o morro de vegetação rasteira e coberto de algumas pedras em forma de laje cravadas na terra.

O velho ipê parecia mais um guardião que ali permanecia desde os tempos de vovó criança, do vovô Abílio abrigando e alegrando as novas gerações com sua imponência, sua beleza.

Toda primavera tingia-se de amarelo, exibindo suas abundantes flores amarelas.

O solo ficava todo tingido de amarelo mais parecendo um tapete com as flores que caiam diariamente e mesmo assim os seus galhos continuavam vestidos de amarelo ouro.

Geralmente vinha da cidade algum tio avô visitar vovó e deixava seu automóvel lá debaixo do Ipê. Todos eles tinham o mesmo modelo, pois na época não havia muitos modelos, eram todos Ford 29, acho eu. Só me lembro bem que eram conhecidos como “furrecas”.

Enquanto todos ficavam lá dentro a conversar e ficava lá perto do automóvel observando o contraste do amarelo das flores que caiam sobre o carro preto (todos os modelos eram pretos, não havia outras corres).
O pára-brisa parecia mais um espelho que refletia o azul infinito do céu e nuvens que mais pareciam barcos apressados a singrar o mar infinito. Ah como gostava de ficar ali, sempre sozinho, falando comigo mesmo e aproveitando cada minuto a sombra e o frescor das flores.
E os pássaros – eram muitas espécies e como brincavam alegres e saltitantes! O João de Barro, ah este parecia ser o dono daquela árvore, edificou sua moradia de alvenaria no mais alto tronco e de lá era o sentinela efetivo.

Eu perdia até a noção do tempo ali junto ao Ipê brincando na relva. Certo dia, estava eu ali absorto em meus pensamentos virando cambalhotas... quando de repente fui surpreendido com papai muito bravo perguntando porque eu não havia atendido ao seu pedido.
Fiquei sem palavras não sabia explica-lo que eu não o ouvira realmente, eu não ouvira ele pedir-me para ir ver as horas no velho carrilhão que ficava lá na sala. Só sei que ele ficara muito bravo comigo neste dia.
Mas nada podia fazer mais e aos poucos toda aquela magia do lugar devolveu-me a alegria novamente e até hoje sinto saudades do velho Ipê.

sexta-feira, agosto 01, 2008

Lembranças de vovó.

Nos anos cinqüenta, lá na roça, não havia energia elétrica, apenas lamparina com querosene ou azeite para iluminar a noite quando necessário.

Algumas fazendas, poucas na região, possuíam um gerador movido por uma roda d água, como o da fazenda de meus avós materno.
A usina ficava nos fundos da fazenda, cerca de uns seiscentos metros abaixo, era alimentado por água do córrego represado que fora desviado para que passasse no terreiro, do lado da cozinha.

Quando mudamos para lá este córrego possuía suas margens irregulares e havia um pequeno volume de água represado e muita água escapando pela sua margem esquerda antes de chegar à barragem.

Lembro-me de vovó chamar meu pai logo depois de nos acomodar e falar:

- Walter eu queria que você acertasse as margens do córrego e a barragem aqui perto do terreiro e arrumasse as caixas de comporta para (¹) moinho, para a (²) usina elétrica e a do (³) carneiro.
Vou pedir para os camaradas carregar pedras para você refazer a barragem e calçar as margens, onde esta com vazamento, ta bom!?

Papai sempre fora um homem zeloso, não era seu ofício, havia voltado há pouco tempo de São Paulo onde trabalhou vários anos numa Mercearia, mas disse que faria sim e logo começou o serviço.

Eu tinha quase dois aninhos e gostava de ficar observando o que papai estava fazendo.

Em poucos dias o serviço estava pronto.
Ah como papai arrumou tudo bonito, gora sim dava gosto ficar sentado ali nas margens, tomar aquela água límpida e fresca o dia todo.
Ouvir o barulho d’água transbordando sob a barragem de pedra. Deitar ali na margem direita do córrego sob a mureta construída pelo papai. Eu passava horas lá observando os pequenos lambaris e girinos que pareciam não se importar comigo ali e se divertiam naquela água límpida e calma.

Havia na margem esquerda três comportas, conforme disse anteriormente, uma para o (¹) moinho, outra para a (²) usina elétrica e outra para o (³) carneiro.
Quando a água não estava sendo utilizada por nenhuma destas comportas ela transbordava por cima da barragem de pedra que papai havia refeito cuidadosamente. E a água seguia seu curso córrego abaixo em direção a casa do monjolo e depois vazava grota abaixo recuperando seu curso de origem.

Qualquer curso de água sempre me fascinou, principalmente aquele córrego o qual saciava minha sede e mais tarde serviu para sustentar minha primeira jangada, feita de tronco de bananeira, na qual passava muito tempo subindo e descendo seu leito, passando pelas margens sombreadas por galhos verdes repletos de amoras deliciosas.

Vez e outra dividiam o espaço com algumas cobras d água ancoradas as margens do córrego. Vovó dizia que cobra d’água não faziam nenhum mal então eu não tinha medo.

Quando chegava o anoitecer era a vez dos sapos que vinham em grupo e dispostos para o concerto. Era uma cantoria só !

Lá da cozinha, no “rabo” do fogão me aquecendo e ainda proseando com vovó ficava a ouvir os sapos lá fora numa animação só!

O concerto começara o tenor prevalecia sobre os demais, era um som que parecia dizer:

“ - joaaaaaão.. cê vaiii ?

- vouuuu!

- joaaaaaão.. cê vaiii ?

- vouuuu!

Ah, havia também um sapo que emitia um som que parecia da bigorna, era o sapo ferreiro como chamávamos pois parecia estar sempre batendo com o martelo em sua bigorna.

E isto se repetia até a madrugada chegar ao meio de outros sons, coaxo e piado de aves noturnas quando esta orquestra não era quebrada por uma raposa, cachorro do mato a espantar as galinhas no galinheiro na tentativa de roubá-las.
Então vovó corria porta a fora em socorro das crias e depois de segura que afugentara os intrusos ela voltava.

Reinando a tranqüilidade vovó voltava a beira do fogão, vovô já havia recolhido em seu quarto e nós ficávamos conversando mais um pouco, geralmente eu como sempre perguntando as coisas para vovó e ela tranquilamente respondendo.

De repente ela se afastava ia até o armário que ficava na dispensa pegava uma taça de leite e dizia:

- Adarto (*¹)... bebe seu leite com farinha antes de dormir.
Pegava a (*²) taça com leite e farinha de milho e com uma colher tomava aquilo com gosto. Depois tomava a bênção e ia dormir.

No dia seguinte tudo se repetia!

(¹) moinho – consiste de uma pedra bruta medindo cerca de 1m de diâmetro por uns 20 cm de espessura, com um furo de cerca de de 15 cm de circunferência ao centro.

Esta roda de pedra na horizontal sob um bloco plano de pedra girava triturando o milho que era colocado sobre o orifício central. Após moído o grão o mistura fina caia numa caixa que armazenava o produto. A Roda de pedra era movido por um sistema de engrenagem em combinação com a roda d’água.

(²) usina elétrica = Um pequeno gerado (motor) movimentado por uma roda d’água que gera energia (contínua) elétrica.

(³) carneiro = uma esfera metálica com seu bojo oco que ao encher de água movimenta um pino criando um sistema hidráulico de elevar a água até um reservatório. Muito utilizado no interior de Minas e Rio de Janeiro.

(*¹) Adarto = é a maneira que vovó me chamava assim como os demais empregados (camaradas) lá da roça.

CORUJA

CORUJA
Meu elemento xamânico.