quarta-feira, dezembro 27, 2006

Uma aventura no Quartel

Era ano de 1969, havia me inscrito no Serviço Militar no 17º Regimento de Cavalaria que ficava na cidade onde estava, em Pirassununga, interior de São Paulo.
Um dos motivos que me atraiu foi a Cavalaria, sempre gostei de cavalos e por isso achei que ia me dar bem.
Realmente, desde os primeiros dias isto foi comprovado. Mas as atividades eram muito diversificadas e os cavalos ocupavam apenas uma parte de nossas tarefas.
Recebi o meu cavalo, não era aquele cavalo, mas logo me entendi com ele e por um ano fomos bons amigos. Conheci seus pontos fracos e ele, acredito, os meus também.
Os exercícios eram coisas fáceis para mim já acostumado com montaria desde criança. Apenas a equitação foi novidade. Saltar obstáculos, trincheiras, etc. Mas logo eu e meu cavalo entramos no ritmo e não houve problemas!
Passado alguns meses foi anunciado que o Quartel todo participaria de uma Manobra Militar em conjunto com a Aeronáutica na Fazenda dos Ingleses!
Sabia que seria um exercício de guerra! Apesar de tudo fiquei dividido entre a aventura de ir e a de escapar de tal façanha!
Foi ai que tive uma idéia!
Procurei o meu superior imediato, o Sargento Gregório e Wantuil e comuniquei, como era estudante na Escola Pública da cidade não poderia faltar à semana de provas!
(Na verdade não era semana de provas, apenas um pretexto para escapar e ficar na cidade)
Apresentei-me ao Sargento, bati continência e disse:
- Sargento Gregório, eu estou com um problema, não poderei faltar às provas da semana!
Com olhar severo, olhou-me e disse:
- Descansar soldado!
- À vontade!
- Vou comunicar ao Major e logo trarei a resposta para você. Mesmo assim continue com os preparativos.
- Obrigado Sargento, disse eu.
Passado algum tempo veio em minha direção o Sargento Gregório, para o qual me coloquei em continência.
- Fique a vontade soldado.
- O major Lara não lhe dispensou das manobras, porém após os exercícios uma das viaturas o trará para a cidade e no dia seguinte o levará ao campo de treinamento!
- Obrigado Sargento - e logo me desfiz da continência.
Chegou o dia da partida, às seis horas o soldado corneteiro toca o toque de alvorada e toda a tropa já com suas mochilas corre em direção ao Rancho para a primeira refeição do dia e logo em seguida partir.
A viagem foi longa, os pelotões seguidos de seus batedores seguiam em fila indiana trotando pelas colinas e serras verdejantes.
Ao atravessar a Rodovia Dutra, uma operação foi montada em conjunto com a polícia Rodoviária para a Tropa passar!
Armamentos, munições e rações eram carregados por cavalos que seguiam a tropa.
A viagem corria tranqüila até o momento que veio um:
- Alto Companhia!!!
Correu a notícia alvissareira de que um incidente havia ocorrido com um dos Pelotões.
Logo vimos um dos veículos de retaguarda passar pela tropa, era um carro de ambulância.
A notícia logo veio.
- Pessoal um dos cavalos foi atingido por uma mina (de festim)!
A exclamação ecoou pelas colinas num só “ ohhhhhh ”.
A indagação permaneceu no ar.
- Quem estaria no cavalo ?
- O soldado também se feriu!?
- Foi grave, o que realmente acontecera!?
Felizmente o incidente apenas feriu o cavalo que pisou numa das minas espalhadas no trajeto. Foi colocado no caminhão ambulância e levado ao Quartel para cuidados médicos!
- Ufa ! – todos respiraram aliviados!
A viagem continuou tranqüila, às vezes até cochilávamos em cima dos cavalos visto que estávamos marchando todos em fila indiana.
Passamos por uma fazenda com imensos laranjais e logo ao me aproximar me estranhei ao ver muitos soldados, dos que estavam à frente, invadindo o laranjal.
Alguém me encorajou a fazer o mesmo dizendo:
- Não se preocupe, todo prejuízo do laranjal é ressarcido pelo Exército.
Foi ai que tranquilamente eu desci do meu cavalo, amarrei-o numa árvore e me uni aos demais que estavam a saborear doces laranja e outras frutas.
Depois de um bom descanso recebemos ordem para entrar em forma e marchar.
Passamos por algumas ruínas de velhas senzalas e fomos comunicados que ali há poucos dias o Exército havia desmantelado alguns guerrilheiros de São Paulo. (Era plena ditadura militar da Revolução de 1964).
Logo chegamos a Fazenda dos Ingleses. Passamos em frente à sede e depara com um senhor magro de boné sentado em sua cadeira de balanço a espreitar a tropa que passava.
Apenas alguns oficiais rumaram em direção a varando onde estava aquele senhor. Parece que para cumprimentá-lo, pois a fazendo a ele pertencia.
Ficamos sabendo depois que aquele senhor de aparência esquia e tranqüila fora um oficial do Exército Britânico.
As primeiras atividades foram montar o Acampamento. As barracas eram utilizadas por dois soldados cada uma.
À tarde rápida chegou e antes mesmo de terminarmos as tarefas ouvi o meu nome ser chamado por um dos oficiais!
- Soldado 294 favor apresentar-se!
- Soldado 294, Neves apresentando! (Corri e coloquei-me à ordem.)
Mas uma dúvida surgiu logo em seguida. Em forma e batendo continência parei-me em frente ao oficial perguntando.
- Senhor! E como faço com o meu cavalo.
Numa rápida atitude o Tenente olhou para o primeiro soldado a sua frente e pediu que além do seu cuidasse também do cavalo 132, o meu!
Fiquei sem palavras, pois era um de meus amigos e sabia que ele ficaria com responsabilidade dobrada. Mas o que eu poderia fazer. Ordens são ordens!
Logo embarquei numa viatura que saiu ainda antes do sol se por e em pouco tempo estava na cidade longe daquele território de treinamento de guerra.
Não pude deixar de lembrar dos colegas que lá no campo estavam a enfrentar uma noite repleta de incidentes.
Mas este segredo eu tinha que guardar, não podia mais voltar atrás.
E assim perdurou a situação durante toda a manobra na Fazenda dos Ingleses. De dia eu participava dos exercícios e a noite ia para a cidade numa viatura do Exército especialmente destacada para isso!
Esta é uma das doces lembranças que o tempo não apagou.

Aconteceu no Natal

Os Shoppings Center estavam lotados de pessoas em busca de presentes, as luzes encantavam a todos com seus arranjos festivos de Natal. As ruas com um movimento intenso de vai e vem de pessoas e carros apressados.
Era já véspera da tão sonhada Noite de Natal.
Eu absorto em meus pensamentos dirigia meu carro rumo à casa de minha irmã onde encontraria a família já reunida. O trânsito estava apressado, todos a caminho de suas casas ou indo para encontrar os amigos, os parentes para com eles festejarem.
De repente, num cruzamento entre duas avenidas movimentadas o sinal fecha e eu parei meu carro a espera do sinal verde.
- Moço! Moço!
Surpreendi-me com aquela voz de criança do lado de fora. Deparei-me com uma menininha, cerca de 8 anos, mal trapilha com uma caixa na mão.
- Moço, compra uma bala. Compra moço!
Eu fora pego de surpresa, um pouco assustado ao meio daquele corre-corre e respondi de imediato:
- Meu amor, eu não tenho dinheiro trocado!
- Ah moço compra!
Olhei dos lados, apenas aquela garotinha estava ali ao meio dos carros, não havia mais nenhum ambulante, nenhum vendedor de farol.
De repente surpreendo-me com a atitude daquela menina.
- Moço, pega a metade. Fica com esta metade e eu fico com a outra!
Fiquei sem palavras com aquele gesto, com as mãozinhas estendidas sobre o vidro de meu carro entreaberto. Titubeie, mas não poderia fazer tal desfeita com o gesto daquela criatura inocente!
- Muito obrigado meu amor.
Mal tive tempo de vasculhar o bolso em busca de algum trocado, fui abalado pelas buzinas impacientes dos carros que estavam atrás do meu.
Então me dei conta do farol que já estava verde e tinha que prosseguir mas antes olhei para os lados e não vi mais a menina de vestido claro e surrado. Desapareceu... e eu fui obrigado a prosseguir, pois todos estavam pedindo passagem em meio ao trânsito.
Mal consegui conter a emoção daqueles instantes atrás! Segui meu trajeto ao encontro dos meus familiares e anos já se passaram, mas a imagem daquele anjo permanece em minhas lembranças!
Por onde andará tal criança? Uma simples mortal ou um ser celestial!?

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Os anos cinqüenta...

Os anos cinqüenta foram anos de muitas criações inovadoras !

Foi no ano de 1950:

- Que apareceu a primeira televisão no Brasil deixando as pessoas maravilhadas diante de uma telinha - vendo cenas serem apresentadas ao vivo, de improviso!
- Foi um ano Santo declarado pelo Vaticano.
- Os primeiros cartões de crédito chegaram ao Brasil, não como os de hoje, mas de papel!
- Nos lares brasileiros surgem muitos inventos que vieram ajudar as mulheres nos seus afazeres.
- A máquina de lavar automática;
- a enceradeira;
- a batedeira elétrica;
- o rádio portátil a pilha, o maior sucesso em todo o país. Mesmo nos mais longíguos recantos podia se ver alguém com um radinho no ouvido!
- O Disco de Vinil, o LP Stéreo;
- o bambolê, alegrias das meninas;
- o robô mecânico sonho de todo menino e quantas outras invenções mais nasceram nestes anos cinqüenta!
Ah e o mais importante não poderia deixar de falar - um nascimento (risos) importante:
o ano que cheguei aqui neste Planeta aos 24 de Fevereiro!

quarta-feira, dezembro 06, 2006

MEU CÃO INESQUECÍVEL

Sou um apaixonado por cães grandes, já tive vários pastores alemães e um belga e muitas estórias para contar.
Mas na infância o meu primeiro cão ( aliás era o cão dos meus avós ) chamava-se Norte. Era um cachorro grande para um menino de dois ou três anos de idade. Eu podia até andar em cima dele, coitadinho, agüentava sem reclamar!
Era muito dócil vivia perambulando pelo casarão, pela cozinha, sala, varanda e ajudava meu avô na lida com o gado. Cachorro muito esperto, ia em busca da vaca mais arredia e trazia ao cural.
Uma coisa que me lembro muito bem era o seu sumiço diário, a certa hora do dia ele desaparecia. Depois de algum tempo descobri o que ele fazia todos os dias!
Ele ia até a fazenda do tio Orozimbo todos os dias ficava lá um pouco em busca de agrado e depois antes do final da tarde retornava para a fazenda da Mata. Era um percurso de cerca de dez quilômetros ida e volta.
Isto já era natural, todos sabiam, só eu que demorei um pouco para descobrir sua façanha.
Certo dia meu avô, a noitinha, chegou na cozinha onde estava minha vó e perguntou:
- Anita, você não viu o Norte ?
- Não, por quê, ele não voltou lá do Orozimbo?
- Não, costuma estar sempre aqui a esta hora, deitado lá na porta da sala, na varanda.
Ficamos todos ansiosos e ficamos a espera que no dia seguinte encontrássemos na porta abanando seu rabo.
A noite passou e logo pela manhã, com a chegada do retireiro veio a notícia.
- Madrinha Anita, o Zé encontrou o Norte morto lá na porteira, debaixo o velho Ipê.
A tristeza foi geral. Mas como morreu, o que lhe acontecera?
Meu avô logo veio com a resposta.
_ Anita, o Norte foi mordido por um cascavel, vi as marcas no pescoço dele.
Certamente ao passar lá pelas bandas do Morro da Onça deparou-se com um Cascavel, apesar de ter lutado mal deu para chegar até aqui.
Estava ele lá ao lado do Ipê, na porteira estirado no chão - morto. Inchado e no pescoço estava a marca indelével das presas da serpente.
Ele se foi, mas a sua lembrança paira até hoje em minha memória!

segunda-feira, novembro 27, 2006

Mistério na Mata

A Fazenda da Mata, ou Fazenda São João fora do meu bisavô Abílio. Vovô João comprou a pelos idos de 1953 e lá passei os mais doces anos da minha infância.
Ah quantas estripulias, quantas aventuras lá vivenciei !
Nos primeiros dez anos a fazenda era muito freqüentada ainda pelos irmãos de Vovó, o tio Juarez, Tio Neném, Tio Mário, Tio Júlio, Tio Renato e a própria Vovó Dolores, Mãe Vó como a tratávamos. Os primos Nardinho, Diogo freqüentavam mais a casa. O casarão era estilo colonial, havia muitas dependências e por isso era possível receber muitos hóspedes.
Gostava quando minha avó Anita recebia umas amigas do Rio; Era um pessoal da cidade e eu ficava espiando de longe aqueles hábitos diferentes dos que eu conhecia.
Mas sentia mesmo a vontade quando nas férias reuníamos os primos lá Dalmilho, Jane, Raquel, Ariete, Denise, Antonio, entre outros. Mas estes citados eram os da minha época que mais compartilhávamos as aventuras e as brincadeiras. Minha irmã Bernadete era novinha e o Pascoal ainda muito criança nem podia acompanhar-nos em todo lugar.
Quando iam embora ficava aquela monotonia... não restava outra opção de vez em quando compartilhar algumas brincadeiras com os filhos dos camaradas.
No final da tarde chegava da roça acompanhados do pai e de outros funcionários o Carlinhos, o Toninho, e o José, (Zé) mas eram crianças de outro nível, muito simples e chegavam cansados mal podiam brincar.
Na fazenda, quando a tarde caia vovô corria para o lado do rádio, as vezes acompanhados por algum empregado e ficavam ouvindo programação de Música Sertaneja para irritação da minha avó que não gostava. Depois hora da novela no Rádio, minha avó e mamãe iam para o lado do Rádio enquanto meu avô se retirava, de vez em quando indo jogar truco lá na sala com os amigos.
Mal a noite se firmava todos começavam a retirar-se. Dormíamos cedo, pois a lida no campo iniciava-se cedo antes do nascer do sol.
A vida lá na fazenda foi modificando se radicalmente, o movimento, a lida com o cafezal, foi cada vez mais diminuindo. Meu pai levou-nos para um Sítio que herdara lá no Porto dos Mendes, no Morro Grande, meu tio To alba estudava fora, só vinha para a fazenda nas férias. Eu, sempre que podia ia passar uns dias lá e o meu quarto preferido era o do meu tio Toalba, pois ele dava as janelas todas para a frente e para o Curral, podia-se acordar cedo com a movimentação dos retireiros ao trazer as vacas para a ordenha.
Certa noite, estávamos só nós três, meus avós e eu. Como não havia companhia me recolhi cedo, ouvia cada badalado do velho carrilhão lá na sala próximo ao meu quarto. Fora isso e algumas vezes o som de algum pássaro noturno era silêncio total.
Podia-se ver as estrelas pela janela que eu sempre deixava aberta para contrariedade de vovó que ia nas pontas do pé e as fechava e eu da mesma forma as abria depois de algum tempo sem fazer ruído.
Era uma noite tranqüila, meus avós deviam star em sono pesado e eu ainda estava meio acordado pensando e olhando para as estrelas lá no firmamento.
De repente - ouvi a trava de madeira ser retira da porta da sala e ser colocada no canto. Como era piso de assoalho, e com o silêncio da noite ouvia se nitidamente o som. Levantei a cabeça, sem sair de minha cama, procurei ver se era meu avô ou minha avó que fora ver algo. Não podia evitar nada a não ser a porta acabando se abrir por total uma das partes.
Um silêncio profundo se fez até que ouvi a minha avó lá de seu quarto falar:
- menino! O que está fazendo ai ? Por que abriu a porta!?
Eu mal pude responder... balbuciando disse lá da minha cama mesmo;
- não fui eu, não sai da minha cama! E virei-me do lado obrindo-me e ficando quieto sem se mexer até que o sono veio!
Lembro que meu avô se levantou, fechou a porta, colocou aquela trave de madeira e saiu resmungando. Creio que pensara que fora eu fazendo arte.
Pude ouvi-lo a caminho de seu quarto;
_ Ara.. esse menino !...
No dia seguinte, levantei-me, meu avô já havia ido para a roça e encontrei minha vó lá diante do fogão a lenha!
Antes mesmo que ela disse algo perguntei-lhe:
- Vó, o que foi aquilo ontem?
- Não fui eu que abri a porta não!
Calmamente ela respondeu acalmando-me.
- Não se preocupe menino, deve ter sido papai, ele sempre aparece por aqui.
- No final de semana eu vou fazer uma visita lá no "Centro" e ver o que ele queria. ode estar precisando de oração.
E assim passou a semana e quando chegamos a cidade foi ela ao centro e contou-me depois que realmente era o Vô Abílio, ele sente saudades e vem sempre visitar a casa.
Mas está tudo bem sim com ele! - disse com toda a naturalidade. Acho que por isso nunca me assustei com fatos inexplicáveis. Aceito-os e acredito que: - " entre o céu e a terra há muito mais coisa que nossa vâ filosofia possa conhecer! "

Obs.: Vô Abílio faleceu no mesmo ano que eu nascera, eu não cheguei a conhecê-lo. Um porta retrato que vovó possui dele me chamava os seus olhos azuis, bem azuis.

Inocência na luz vermelha

Chegara as tão sonhadas férias. Eu tinha meus 15 anos, estava estudando no Seminário em Itajubá, Sul de Minas Gerais. Só visitava minha família nas férias.
No meio do ano eram pouco mais de 15 dias então passava em São Paulo com meus pais e irmãos. Mas as férias de final de ano, as mais esperadas ia para São Paulo e depois de ficar alguns dias com meus pais, geralmente depois do Natal ia com minha mãe e meus irmãos para a cidade natal, Campo Belo.
Revia os primos, os tios, e a maior parte do tempo queria passar na roça, na fazenda com meus avós. Como eram gostosos estes dias que lá passava.
Finais de semana íamos todos para a cidade, não que eu gostasse, pois na fazenda era muito mais divertido, mesmo quando só eu estava lá. Andava a cavalo, nadava muito, escalava morros e sem falar na fartura de frutas que lá havia.
Quando estava na cidade costumava passar algum tempo em companhia dos primos e principalmente do Nardinho, um primo em segundo grau, mas para mim todos eram primos. Ele era um pouco mais velho que eu e costumava me levar para um restaurante em frente a Praça da Matriz, esquina com a Afonso Pena e lá entre conversas e animação íamos saboreando um torresminho e tomando uma cerveja. Não estava acostumado a tomar cerveja, mas pela sua insistência eu o acompanhava.
Nardinho era uma destas pessoas que conhecia todos da cidade e apresentava-me a todos os seus amigos.
Certo dia ele disse-me - hoje a noite passo na casa da vó Anita para te pegar, quero levá-lo a casa de uma amiga.
Como eu gostava da companhia do primo não poderia recusar o convite.
A tardezinha, já anoitecendo fomos nós em direção a Estação Ferroviária à visita combinada.
Chegamos a uma casa próximo a Estação onde ele foi entrando e cumprimentando a todos.
Entramos por uma sala ampla, com algumas mesinhas e cadeiras onde algumas pessoas conversavam, geralmente casais. Logo encontrou uma moça a qual fui apresentado.
- Este é o Adauto, meu primo ele está estudando no Seminário - disse ele a moça.
Em seguida me vi sentado a uma mesinha com aquela moça que começou a conversar comigo e a perguntar-me sobre a vida lá no Seminário. Como era, o que eu fazia, etc...
Logo notei o desaparecimento do meu primo e continuei lá naquela sala em penumbra, havia algumas lâmpadas vermelhas tornando o ambiente um tanto reservado.
Não faltaram assuntos, a moça parecia curiosa a perguntar-me sobre o meu dia a dia e eu calmamente e inocentemente continuei a responder a tudo até que começou a faltar-me assunto e ela já meio sem graça também silenciou. Vez ou outra lançava-me um olhar e um sorriso.
Indaguei-me sobre o Nardinho, onde teria ido e ela calmamente me acalmou dizendo que logo estaria lá de volta. Tratou de reforçar o prato de petiscos e pedir mais cerveja.
Já se fazia tarde, minha ansiedade e meu desconforto ali aumentava.
Foi ai que surgiu o Nardinho acompanhado de outra moça que da mesma forma da primeira apresentou-me como seu primo que estudava no Seminário.
Perguntou a minha anfitrião se gostou de mim, esta respondeu que sim meia encabulada também.
Despedimos-nos e fomos para casa, minha mãe e minha avó devia já estar preocupadas comigo.
Caminhamos meio em silêncio sem ao menos comentar sobre a visita e cada qual foi para sua casa como se nada tivesse acontecido.
Minha mãe e minha avó nada perguntaram e logo fui para o meu quarto ainda sem saber exatamente o que era aquele lugar que conhecera. Achara sim um tanto estranho, pois a casa apesar de pessoas aparentemente felizes, comendo e bebendo, achei-as um tanto frias para ser uma casa e de amigas do Nardinho.
Passou-se um ou dois dias... pude ouvir a tia Arlete - que era uma daquelas pessoas alegras com uma risada contagiante e forte - contar para o tio Juarez, outras tias e amigas que o Nardinho havia me levado a Zona.
Foi ai então que compreendi o motivo daquele convite. Mas continuei na minha inocência sem ao menos ter deixado ser iniciado.Fiquei morrendo de vergonha, encabulado e evitei confrontar-me com os tios por um bom tempo, se contaram para minha mãe não sei, porque nunca ouvi comentário por parte dela.
Nunca mais falamos sobre o assunto e muitos anos se passaram, mais de 40 anos, outro dia comentei o episódio pela primeira vez com o Nardinho durante uma conversa com ele, no Messenger, visto que mora em Brasília desde aquela época e nunca mais o encontrei, somente agora pela internet.
- Ah, isso não foi nada, das coisas que eu aprontava esta foi a menor. - disse-me ele !

quarta-feira, novembro 15, 2006

MORRO DA ÉGUA

Era uma daquelas tardes de verão em que as cigarras pareciam estar afinando o som para uma grande orquestra. O sol brilhava e algumas nuvens carregadas despontavam no horizonte, mas grande parte do céu mantinha-se azul. Papai disse a mamãe que precisava levar a massa de mandioca seca para vovó fazer a farinha lá na fazenda e que iria mandar-me levar a cavalo.
Preparou dois sacos (50 kg), encheu-os da massa de mandioca já seca, amarrou os sacos e ajeitou-os na garupa da égua que estava já encilhada e pronta para me levar a fazenda da Mata. Se apressasse iria chegar lá antes do anoitecer, era uma boa caminhada, umas duas ou três léguas de distância (aproximadamente 15 km). Mas como ia carregado, a égua não era assim tão ligeira, precisava se apressar e papai logo despachou-me recomendando que eu fosse direto com medo que a chuva me pegasse no caminho.
Eu tinha apenas oito anos de idade mas sabia me virar e conhecia bem o caminho para a fazenda do vovô.
Após as recomendações de meus pais, tomei a bênção de papai e de mamãe e pulei na sela em meio a carga que iria transportar e segui meu caminho.
Passei pela fazenda da Beija, depois em frente a venda lá na beira da estrada do Porto e segui em direção ao Morro da Égua. Agora entrando numa trilha que cortava o morro em direção ao Morro da Onça, nenhuma casa, nenhum sítio ou fazenda a não ser depois, lá do outro lado ao terminar a descida do Morro havia sim um Sítio com uma casinha com um curral ao lado bem na beira da estrada, mas ia demorar a chegar lá.Enquanto caminhava lentamente no lombo da égua pelas trilhas daquele morro, ia sentindo os dois sacos pendurados na garupa cada qual querendo pender para um ou outro lado. Mas estava bem amarrados, não havia perigo de cair, pensava e aproveitava para olhar uma ou outra fazenda que se avistava ao longe podendo visualizar a silhueta esbranquiçada da sede com seus telhados vermelhos escuros. No caminho cruzava apenas com bandos de anús espalhafatosos e alguns gaviões em busca de presas em seus vôos rasantes. Lá em cima parece que São Pedro estava preparar alguma faxina bem pesada. As nuvens se aglomeravam e o céu começara a escurecer de repente. Isso não era bom sinal, a égua mostrava-se sinal de cansaço e não apressava os passos e eu começava a me preocupar pois não havia nenhuma casa ou abrigo a vista. E as chuvas de verão costumam ser fortes e com muitos raios e trovões por estas bandas. O que fazer ? Nada senão continuar o percurso, já estava começando a descida do Morro da Égua, voltar agora não dava mais, com um pouco mais de sorte chegaria ainda antes do anoitecer no mínimo na fazenda do tio Orosimbo, assim pensava eu.De repente um trovão esbravejou de tal modo fazendo um grande eco no vale lá em baixo na mata. Outros raios e trovões se sucederam, cada vez mais fortes e de repente veio a chuva que preencheu todos os cantos que minha vista alcançava. O que fazer ? Senti que os sacos de massa de mandioca seca já não eram mais secos e certamente o peso duplicaram no lombo do animal. Desci, tomei as rédias e a dianteira e num grande esforço continuei debaixo daquela chuva a puxar e conduzir a égua que antes me transportava. Ficar ali, debaixo daquela chuva, debaixo de árvores não era bom, havia muitos raios. Tinha que chegar naquele sítio lá em baixo e pedir auxílio!
A noite antecipou sua vinda, tudo ficou escuro mal podia ver a trilha a minha frente e cada vez mais eu me esforçava para puxar a égua que não estava mais suportando o peso, mas não podia fazer nada, eu nem agüentaria tirar de seu lombo aqueles sacos, cada um do meu tamanho e agora encharcados muito pesados. Conversava com a égua, pedindo-lhe calma e que colaborasse para que pudéssemos chegar num abrigo. Na medida do possível ela procurou entender-me e seguiu-me.
Já podia avistar uma fraca luz a cerca de uns mil metros, sabia que estava chegando no sítio lá na baixada, ufa que alívio!
Sai da trilha e rumei em direção daquele sítio, a luz de lamparina agora estava mais forte e podia ter a certeza de que havia alguém lá.
Abri a porteira do curral e levei minha égua para uma cobertura e dirigi-me a porta da sala e chamei: - Ó de casa? - Tem alguém ai?
- De casa?
- Oi, quem é?
- Nossa, marido tem um menino aqui todo molhado!
Fui logo dizendo a dona:
- Sou filho do Walter, neto da Anita e do João Dolores.
- Uai, entra menino, vamos trocar esta roupa molhada.
Nisto o marido foi lá no curral retirar os sacos e a sela do lombo da égua. A dona tratou de arrumar uma calça e camisa do marido, embora grande, vesti e me aqueceu depois de me secar com uma toalha que ela me deu.
Na casa só havia o casal, já era tarde e a dona tratou de arrumar a cama no quarto de hóspedes e disse para eu ir deitar e seguir viagem no dia seguinte eu agradeci e fui me recolher.
No dia seguinte, bem cedinho levantei, vi que o tempo havia melhorado, já não chovia mais e o sol estava para nascer. Tomei um gole de café com leite quentinho com uns biscoitos de polvilho. Logo agradeci a pousada, a acolhida e segui minha viagem, um pouco adiante passei pela casa do Osmar, um camarada do tio Orosimbo, logo depois passei pela fazenda do tio Orosimbo que já estava na lida lá pelo curral. Sem mesmo descer da égua tomei a benção e segui ao meu destino.Por volta das sete horas da manhã, ao cruzar o Morro da Onça o sol já brilhava no céu agora límpido ! Já podia avistar a fazenda da Mata. A fumaça branca saindo da chaminé denunciava já a Vó Anita em sua lida diária.
Chegando apeei de minha égua, antes mesmo de retirar-lhe a carga subi pelas escadas do alpendre lá da sala e fui direto a cozinha onde surpreendi minha vó que olhou espantada.
- Nossa menino, chegou cedo hein?
Mal sabia ela o que sucedera na noite anterior. Ai comecei a narrar o que aconteceu e onde busquei abrigo.
Ela confessou então que havia pensado em mim e achava que eu não viria devido ao mal tempo e ficou aliviada por ver me bem e a salvo.
Missão cumprida ! A tardezinha, depois de assegurar-me que o tempo não iria piorar retornei ao Morro Grande para não preocupar meus pais. Naquela época não havia como se comunicar, não havia telefone.
A volta foi tranqüila pelo bom tempo e pelo fato de agora não estar carregando nenhuma carga pesada. E para quem já cavalgou deve saber que o animal caminha melhor quando está retornando. Cheguei em casa antes do sol se por e encontrei meus pais ansiosos pois meu pai havia tido alguns pressentimentos na noite anterior e inclusive mamãe me contara que ele ouvira um grande ruído, um estrondo muito forte lá na encosta do morro e havia ficado muito preocupado comigo.
Contei tudo o que havia ocorrido e que apesar do susto, do frio e do medo consegui abrigo e depois seguir viagem com tranqüilidade.
Hoje, lembro destes fatos com saudade e até me orgulho de situações que enfrentei apesar da tenra idade naquela época.

sexta-feira, novembro 03, 2006

O CRUZEIRO



Era uma criança humilde, encabulado, tímido, mas com sede de saber.
Lembro-me quando tinha meus cinco anos morava com meus pais na roça, passava maior parte do tempo na fazenda de meus avós. Vovó embora não letrada era uma pessoa culta. Contava que no seu tempo foi alfabetizada e instruída em casa. Não freqüentou escola, mas teve professor particular em casa, pois ela era a única mulher da família e teve educação a domicílio.
Enquanto cuidava dos afazeres da fazenda, com sua lida entre a cozinha, o monjolo e a administração geral sobrava tempo para orientar e incentivar-me na leitura e na audição de rádio.
Dizia, - “.Adarto” é muito importante a gente saber ler, saber o que está acontecendo no mundo. Vai ouvir o Repórter Esso para saber o que está acontecendo. Pegue jornal e vê as figuras, leia o que você puder.
Sempre trazia da cidade pacotes de jornais e deixava por lá. Sempre que me via desocupado, sem o que fazer mandava que arranjasse um canto na sala, geralmente deitado debaixo da mesa, ficar folheando algum jornal.
De vez em quando eu corria a pedir ajuda, explicação de algo que me chamava atenção.
Mas uma coisa que mais me deixou saudade e até sinto aquela sensação especial que sentia quando criança lá na roça era a esperada Revista O CRUZEIRO.
Engraçado mas, quando eu era criança o dia de Natal demora muito para chegar assim como nosso aniversário e outras datas como Semana Santa. Ficávamos ansiosos e o tempo não passava, demorava-se muito, muito mesmo!
Mamãe contava que lá na cidade grande Papai Noel comprava presentes e levava a todas as crianças e que havia grandes árvores com enfeites, lâmpadas e bolas coloridas e muita festa nesta época. Eu ficava noites e noites sonhando com o Papai Noel e procurando sua carruagem no meio das estrelas lá no céu. Mas não cansava de folhear e admirar cada página da Revista O CRUZEIRO que mamãe trazia da cidade. Havia muitas fotos do Papai Noel, de seu trenó, de suas renas!
A minha imaginação ia longe! Nada daquilo acontecia na fazenda, mas eu sonhava com Papai Noel e tinha certeza que ele pelo menos na noite de Natal viria deixar um presentinho para mim.
Logo percebi que apesar de acreditar na existência de Papai Noel sabia que nossos pais é que compravam os presentes. Mesmo sabendo disto eu fazia questão de manter o segredo, aquela atmosfera de segredo, suspenso mesmo sabendo antecipadamente o que mamãe havia comprado. Na véspera da noite de natal, conforme orientação de mamãe, eu sempre colocava meu sapato na janela e ia dormir e logo de manhã corria para ver o resultado, Ah quanta saudade desta época.E da Revista O CRUZEIRO a lembrança da magia que havia no mundo que vivi quando criança. Lembro do cheiro de suas folhas. Papel cheirando tinta. As cores fortes, as imagens chamativas. As propagandas engraçadas. A caricatura do Amigo da Onça. Ah que saudades de O CRUZEIRO !

INCIDENTE BATIZADO

Era uma manhã ensolarada, a família toda reunida preparava-se para o batizado do meu primeiro irmãozinho. O padre arrumava-se para o a grande cerimônia, o batizado do sobrinho. Morávamos bem ao lado da igreja no pequeno vilarejo do Porto dos Mendes da década de cinqüenta. Naquele tempo corria garboso e ainda jovem o Rio Grande em direção a Serra de Boa Esperança. O mesmo rio que décadas antes servia de leito para os poderosos vapores que carregavam o progresso entre São Paulo, Minas e outros estados do Brasil.
Mas voltando aquele domingo, todos já na igreja aguardavam o padre Antonio iniciar o esperado batizado do Pascoal e da Neuza, nossa prima.
A família tinha mais de um motivo para tanta alegria, além das crianças queridas o celebrante era o padre Antonio, o querido tio Tonho.
Estavam todos em volta da Pia Batismal, eu ainda uma criança de quatro anos buscava um espaço para acompanhar aquela, (acho minha primeira) cerimônia religiosa. .
Não sabia se prestava mais atenção no meu irmão que chorava a beira da pia batismal ou se admirava as vestimentas brancas e a estola verde que tio Tonho usava.
De repente, algo inesperado que aconteceu lá fora quebrou o ritmo daquela cerimônia. A atenção toda se voltou para a rua lá fora. Eu, sem saber o quê ocorria, corri para a janela a procurava de uma explicação. Foi quando eu vi o tio Tonho colocando as mãos na cabeça de um homem que caiu do caminhão.
Na verdade o que ocorreu foi o seguinte, enquanto o batizado estava ocorrendo, um caminhão cheio de jogadores de futebol estava indo em direção a Balsa para atravessar o Rio Grande e um dos passageiros na euforia do grupo e depois de beber cachaça acabou caindo do caminhão e tio Tonho num ímpeto fraterno correu preparado para aplicar, se necessário, a extrema-unção
Porém, nada de mais grave aconteceu além de algum ferimento na cabeça e logo o padre retornou a igreja e a cerimônia continuou o seu ritmo festivo.
Terminando a cerimônia religiosa todos se uniram num grande almoço para comemorar os recém batizados e também festejar a presença do tio padre em nosso meio.

sábado, outubro 28, 2006

Recordações da infância

As noites frias e profundas me trazem recordações, sensações, impressões, de uma fragrância de infância de criança.
Noite fria, céu estrelado, a lua bailando lá no céu de julho. No casarão se via a fumaça branca que subia pela chaminé, as janelas semi-fechadas deixavam ver a movimentação na cozinha em volta do fogão a lenha. Era férias de meio do ano, o sossego, a tranqüilidade e o silêncio já não era como os de todas as noites. Vovô e vovó que normalmente a esta hora já estariam dormindo permaneciam até mais tarde reunindo os netos em volta do fogão, assando queijo na chapa e a pedido dos netos contando causos. Vovó sempre preocupada conosco cuidava de preparar algumas quitandas para comermos. Sempre ouvia se ela dizer: menino, come alguma coisa, toma leite!
Pegue uma *tigela e come com farinha!A noite avançava e o frio aumentava lá fora! O que fazia que nos mantivéssemos todos em frente o braseiro que consumia lá no fogão.Acostumados a deitarem cedo, com pouco meus avós se retiravam ao quarto e ficávamos por ali ainda, falando mais baixo para não incomodar mas conversando muito, rindo e matutando o que fazer no dia seguinte.Como o céu estrelado era muito bonito, apesar do frio, antes de dormir ainda ficávamos lá no alpendre ou na janela do quarto observando as estrelas cadentes que eram freqüentes e imaginando como seria a vida noutros mundos.De vez em quando ficávamos quietos, pensativos só observando lá em cima o céu repleto de estrelas e na escuridão na mata o pisca pisca dos pirilampos e vaga-lumes que invejando as estrelas reluziam o campo e as matas.O silêncio muitas vezes era quebrado por um piado de alguma ave noturna que cortava o espaço em vôo rasante. Lá no pasto, nalgum tronco a coruja piava ! Vez ou outra ouvia se outras aves noturnas aqui ou acolá.Muito assunto, muita conversa mantinha nos acordado até que exaustos um a um ia se deitar para logo mais ao nascer do sol todos de novo começar a nossa lida!
Assim eram nossas férias na fazenda e hoje resta-nos apenas as sensações, impressões de uma fragrância de infância, de criança. E a certeza de que fomos muito felizes e aproveitamos o tempo que se foi e jamais voltará!

sexta-feira, outubro 27, 2006

O pequeno polegar

O dia em que quase perdi o polegar

Era uma criança que desde cedo fui acostumado a ajudar meus pais nos afazeres da casa. Havia hora para trabalhar, estudar e brincar.
Nunca fui obrigado a fazer trabalhos pesados, mas sempre tive vontade de ter minhas pequena plantação, queria aprender a cultivar a terra e diante de meu pedido papai deixou uma pequena área para eu plantar. Ah como era gratificante depois de algum tempo ver germinar as sementes, crescer o feijão, o arroz, as ramas de batata, mandioca, as hortaliças.
Papai plantava de tudo para o nosso sustento e sobrava até para vender. Havia um plantio de mandioca que dava para fazer farinha e polvilho. Para facilitar o beneficiamento ele construiu uma engenhoca para ralar a mandioca exigindo-se pouca força devido as rodas e engrenagens da máquina. Até uma criança como eu, de sete, oito anos conseguia mover a manivela do ralador manual.
Certo dia, enquanto meus pais cuidavam de outros afazeres pedi para adiantar o serviço indo ralar mandioca. Não precisava de muita força para mover a roldana, o trabalho ia bem. Com a mão direita movimentava a manivela e com a esquerda empurrava a mandioca que produzia uma massa alva e espessa. A bacia aos poucos enchia daquela massa, tudo estava indo tranqüilo e sem cansaço.
De repente, o branco tornou-se rubro, mal pude perceber o que havia acontecido.
Como de repente aquela massa alva manchava-se de vermelho forte?
Foi tudo tão rápido que só depois de um tempo pude perceber o que havia acontecido.
Segurava firmemente a mandioca com minha mão esquerda quando de repente acabou se a raiz e foi o meu dedo sem que eu percebesse.
Os dentes do cilindro cravaram em meu dedo polegar deixando ranhuras profundas e quase o deslocando.
Deixei o local e segurando meu dedo com a mão direita e sai correndo gritando por meu pai.
- Pai, paieeeeeeee!
- O que foi filho?
Correu comigo para dentro de casa colocando logo um punhado de sal grosso com água lavando bem o ferimento que continuava sangrar.
Tratou de colocar um pano em volta amarrando-o e pegando-me ao colo acalentando-me na tentativa de acalmar-me.
Os dias se sucederam e o machucado estava com mau aspecto e ainda doendo muito.
Falei com meu pai que o meu dedo polegar estava com mau cheiro, e que o ferimento estava piorando.
Foi ai que ele resolveu levar-me ao Porto dos Mendes onde tio Cristiano possuía uma pequena farmácia, a única da região.
Chegando lá tio Cristiano tirou aquele pano que servia de curativo e fez uma assepsia terminando com um bom curativo com gazes e esparadrapo. Receitou-me alguns remédios e orientou papai como cuidar e fazer novos curativos.
Já se passou quase 50 anos e no meu dedo as marcas deste episódio do dia que quase perdi meu polegar.

Morro da Onça.



Esta era a visão que se tinha da janela da sala e do quarto onde eu dormia na Fazenda da Mata. Passei boa parte de minha infância observando esta paisagem. Com certeza os melhores dias da minha vida.
Ao fundo imponente aparece o Morro da Onça, nome este devido ser muito comum a freqüência de onças pintadas e jaguatiricas por lá. Em minha infância cheguei a cruzar com algumas Jaguatiricas, mas onças pintadas só em estórias contadas pelo meu avô e pelos camaradas da fazenda. De vez e outra ouvia se dizer que alguma cabeça de gado havia sido atacada por uma onça pintada e o temor corria pela redondeza.
Esta foto foi tirada na década de setenta, mas posso garantir que antes dos anos sessenta o cenário era muito mais belo. Onde se vê as plantações outrora era ainda mata virgem, os cafezais se estendiam mais a direita. A mata original era linda e embelezava a paisagem e favorecia a uma rica fauna.
Mas atenho-me agora a falar mais precisamente do querido e saudoso Morro da Onça. Com freqüência costumava passar a cavalo numa trilha que cortava sua encosta esquerda ou de Jipe com meu tio ou meu avô. Era o caminho que levava à Fazenda do tio Orosimbo que ficava a uns 6 quilômetros da fazenda do vovô. Costumávamos revezar semana sim semana não íamos passar o domingo lá e as vezes acompanhava meu avô em suas idas a negócio com o tio Orosimbo.
Ao passarmos ao lado do Morro costumava ficar olhando para o seu topo e almejando o dia que eu pudesse subir até lá e poder observar os quatro pontos cardeais. Sabia que de lá poderia ter uma bela visão ao Sul das bandas do Rio Grande, do Porto dos Mendes e em destaque se via o Morro de Ponta, local em que meu avô morou quando mamãe era criança. Eu gostava de ir lá com meus avós. Era um lugar pitoresco. Do lado norte, bem distante se via no horizonte o delinear da cidade de Campo Belo esbranquiçada mesclando-se com o céu azul salpicado de brancas nuvens. Ao oeste se avistava a Fazenda da mata e ao Leste a Fazenda do vovô avistando-se a sede toda imponente ao pé do Morro dos Maias ou dos Pimentas.

Enquanto eu vivia meus primeiros anos de vida, minha primeira infância, não havia outro meio senão contemplar diariamente a beleza do Morro da Onça e sonhar com o dia que eu pudesse aventurar-me pelas suas matas e atingir a pedreira que cobria seu cume.
O tempo naquela época parecia não passar, demorava-se muito para chegar o final de semana, as festas de fim de ano, os aniversários. Eram dias intermináveis, parecia que o relógio era bem preguiçoso. Ao contrário de hoje.
Só sei que tudo acabou passando e quando percebi já estava morando em São Paulo e não via a hora de chegar as férias de meio do ano e as de final de ano para lá na Fazenda ir matar a saudade.
Nos primeiros anos que se sucederam, depois de estar morando em São Paulo, geralmente combinava com os meus primos para irmos juntos. Íamos eu, minha irmã Bernardete, as vezes o Pascoal também e lá nos reuníamos com a Raquel, a Juanita, a Jane, a Aríete, o Dalmo William e a Denise e deixávamos vovô bem nervoso com nossas aventuras. Os outros primos, Cida, o Antonio, o Rogelio geralmente não participava de nosso grupo lá na fazenda. Poucas vezes se reuniram a nós a não ser quando íamos todos para a cidade.
Na fazenda organizávamos os dias todos com muita aventura, escaladas de morro, nadar no açude (uma piscina natural adaptada num buraco de onde se retirava terra para fazer tijolos). E lógico começamos a planejar e executar nossas aventuras no Morro da Onça. A primeira vez que escalamos o Morro da Onça, levamos uma bandeira branca feita com tecido que pegamos lá da vovó, acho que um velho lençol. Ficamos orgulhosos em deixá-la tremulando lá no topo de uma árvore.
Levamos frutas e lanches para passar um bom tempo lá em cima, o dia todo. A subida fui um tanto cansativa, pois tivemos que ir a frente das meninas, eu, Pascoal e Dalmo William abrindo trilha e ajudando-as a passar pelas pedras que haviam no caminho. A encosta era toda ladeada de grandes pedras e vegetação rasteira sob as árvores. Haviam nos alertado sobre o perigo das Cascavéis que eram muito comuns naquele morro. Por isso a nossa primeira escalada foi de muito suspense e certo medo. Felizmente nem mesmo encontramos com nenhum tipo de réptil para nossa sorte e tranqüilidade.
Ao chegar ao topo, como imaginávamos, havia uma grande pedra formando uma laje, em certo declive claro, mas própria para organizar um belo piquenique vislumbrando um belo cenário. O dia estava quente, era pleno verão, mas a brisa que soprava lá em cima ajudava a refrescar um pouco o calor que sentíamos. A água que levamos estava no fim, o que valeu foram as laranjas e mexericas que levamos conosco.
Pudemos observar e saborear aquele cenário maravilhoso. Viam-se as estradas, os trilhos que cortavam os campos verdes, as casa dos camaradas, as fazendas ao longe se destacavam das casas dos camaradas que pareciam todas minúsculas. Os trilhos formados pelo gado que contornavam o vale desenhavam linhas sinuosas que serpenteavam todo o morro lá em baixo levando o gado até a grota onde iam matar a sua sede.
No topo do morro mal podíamos ouvir algum ruído daquelas casinhas lá em baixo na colina, apenas o barulho do vento e o canto dos pássaros.
Bom seria ter uma casa construída lá no topo. Como seria bonito ver o nascer e o por do sol de camarote todos os dias. Observar qualquer pessoa, animal, ou veículo que se aproximasse vindo de algum ponto. Lá de cima podia se ter uma visão privilegiada dos quatro quantos, que maravilha. Mas o sol se adiantava e começava a dar sinal de fim de dia. O pessoal lá na fazenda devia estar apreensivo conosco, tínhamos que apressar nossa descida. Por isso levantamos, com pesar e começamos a descida, mas já planejando outro retorno ainda naquelas férias.
A volta foi tranqüila, ainda deu para parar no pé do morro e apanhar algumas mangas deliciosas e ir saboreando-as enquanto caminhávamos. Chegando a fazenda estávamos todos felizes a contar a nossa façanha e a descrever a beleza que se vê lá de cima para mamãe e a vovó que ouviam atentamente e admiradas. A hora do jantar se aproximava e deixamos as meninas irem para o banho primeiro ficando nós os homens para o final.
Outras escaladas foram planejadas e executadas naquelas férias e em outras. Sempre foi com a mesma alegria e aventura, mas, a que mais marcou foi a primeira vez que lá estivemos. Esta ficou na memória de todos nós e ainda posso sentir aquele vento, e parece que ainda estou vendo toda aquela paisagem a minha frente.
Tudo parece ter mudado, a Fazenda da Mata onde vivi meus melhores dias da infância não é mais como era, a Fazenda do tio Orosimbo, também acho que não mais existe, mas o Morro da Onça, este sim, está lá do mesmo jeito imponente observando tudo e a todos a seu redor. Apenas sofreu com a derrubada da mata ao seu pé, foi o que pude observar em minha última vista dele.
Ah que saudade sinto de minha terra natal... saudade do Morro da Onça de minha infância!

Lembranças da velha estrada de ferro - RMV.

RUIM MAIS VAI


Rede Mineira Viação (que levava inscrito em seus vagões a sigla R M V ) é o nome da antiga ferrovia mineira que cortava as alterosas levando pessoas, gado, café e minérios. Conhecida pela sua deficiência mas querida pela tradição era carinhosamente chamada de Ruim Mais Vai. Só pra se ter uma idéia, um trajeto que hoje se faz em pouco mais de três horas, levava-se 12 horas com a velha Maria Fumaça que tranqüilamente cortava campos, colinas e montanhas enquanto uma nuvem de fumaça singrava os céus. Até o final da década de cincoenta reinava a Maria Fumaça, no alvorescer dos anos sessenta chegaram imponentes as primeiras locomotivas a diesel. Era comum o embarque e desembarque de gado nos vagões apropriados, de madeira pintadas de vermelha. A Estação Ferroviária era o lugar mais movimentado, à noite passava o "noturno" que vinha de São Paulo e ia até o norte de Minas. O seu apito era quase um aviso para a cidade adormecer, depois que se ia a cidade acabava de se aquietar e se preparar para o novo dia..






RUIM MAIS VAI

Fumaças ao léu

Ruim Mais Vai

Maculando os céus

Ruim Mais Vai

Num passo de corcel

Ruim Mais Vai

Braseiro incandescente

Ruim Mais Vai

Fagulhas ardentes

Ruim Mais Vai

Como um corcel

Rede Mineira Viação

Levando nossa gente

Nossa gente Gente !




quinta-feira, outubro 26, 2006

TRAVESSIA A CAVALO NA BALSA

Era final da década de 50, a vida no Morro Grande era demasiadamente pacata, passávamos dias sem ver a presença de uma pessoa estranha a família. Na divisa de nosso sítio havia uma estrada, mas dificilmente se via alguém passar por ela. Algumas vezes se via algum caminhante que ia a direção do Porto dos Mendes. A estrada, mais adiante, do outro lado do morro que ligava a Cidade e o Porto passava a velha Jardineira pela manhã indo para a cidade e a tardezinha ouvia se o ronco do motor cansado voltando. Um dia ou outro ouvia se o ronco do motor de algum caminhão ou a caminhonete “pick up William” de um fazendeiro lá da beira do rio que ia ou voltava da cidade. A noite sim se via, com mais freqüência, a luz ao longe, no pé da serra os carros que vinham da Rodovia Fernão Dias em direção a cidade de Boa Esperança. Do mais não se ouvia nem o barulho de avião cortando os céus. Mas a natureza era pródiga em pássaros e grande variedade de outros animais que quebravam a monotonia do lugar com seus cantos e sons específicos.
Raramente íamos ao povoado de Ribeirão ou Porto dos Mendes, a não ser quando meu pai precisava comprar alguma coisa na venda ou quando me mandava ir vender hortaliças no povoado - jiló, tomate, repolho ou outro produto de nosso sítio.
Logo de manha papai preparava duas *caçambas cheias dos produtos a serem vendidos, colocava na sela do cavalo e não esquecia da medida, uma lata de óleo vazia, para medir o produto. Acontece que eu sempre queria agradar aos fregueses e colocava sempre um pouco mais que a unidade da medida padrão (o litro). Quando chegava a casa sempre era questionado pelo resultado da venda que era sempre menos do previsto. Explicava que eu sempre colocava um pouco mais da medida para cativar as pessoas para de outras vezes comprarem de mim e não de outros. Lembro que isso justificava um pouco, mas não agradava totalmente papai.
O povoado era pequeno, muita gente possuía a sua própria horta, o que dificultava a venda, por isso às vezes ia até o povoado do Sapecado que ficava na outra margem do Rio Grande. Mas papai alertava sempre que eu deveria deixar o cavalo do lado de cá, no Porto para não ter que pagar duas passagens na Balsa.
Mas certa vez resolvi ir ao Sapecado a cavalo, era mais cômodo, tomei a Balsa e embarquei o cavalo também pagando duas passagens, papai não precisaria saber, o dia parecia estar produtivo já havia vendido boa parte e sabia que lá no Sapecado venderia o restante. Não havia o que se preocupar. Mas papai não poderia saber, pois certamente haveria uma boa bronca. Atravessei o rio com o meu cavalo e lá fui eu pelas poucas ruas que havia todo imponente levando meus produtos e oferecendo de casa em casa.
Qual não foi a minha surpresa ao passar pela praça, em frente à Capela vejo surpreso o tio Pedrinho lá aguardando a hora do horário da Balsa para o Porto dos Mendes. Não pude deixar de mostrar meu contentamento ao ver meu tio por lá, mas por outro lado subiu um arrepio de medo do que poderia acontecer se ele se encontrasse com meu pai e falasse que me encontrou no Sapecado e a cavalo! O que tivesse que acontecer aconteceria, nada mais poderia fazer e passei o resto do meu tempo ao lado do meu tio até a travessia do rio.
Ao final da tarde, já a noitinha, cheguei a casa e encontrei papai e mamãe aflitos querendo saber como foi o dia e porque chegara tão tarde. Contei que havia vendido tudo e que havia encontrado o tio Pedrinho lá no Sapecado e que havíamos atravessado a Balsa juntos, depois passei para ver a tia e por isso a demora.
Nem queria imaginar se o tio Pedrinho viesse a contar-lhe sobre o cavalo. Porém sabia que assim que meu pai estivesse com ele isso seria inevitável. A verdade é que comecei a sofrer antecipadamente. Certo dia meu pai esteve no Porto e quando voltou veio direto ralhar comigo. Ele não costuma bater em mim, nem nos meus irmãos, mas só o modo que falava ralhando era o suficiente para ficar muito triste e até chorar. Vez ou outra, em caso mais grave levava-se uma palmada ou um puxão de orelha. Não mais que isso.
Mas atravessar a balsa com o cavalo nunca mais! Voltei mais vezes em busca da freguesia lá para os lados do Sapecado, mas sempre deixando o cavalo amarrado ao bambuzal que fica ao lado da base da Balsa. E jamais esqueci do encontro inesperado com meu tio.
Depois de quase cincoenta anos, outro dia destes, falei com meu tio sobre essa passagem, ele sorriu e com sentimento de culpa disse-me: - Uai, você me desculpa então, eu não sabia que você teria problemas.

quarta-feira, outubro 11, 2006

João Paulo II

Hoje, sinto a dor e a tristeza de todo o povo de Deus
abalado com a partida de um dos maiores homens que sucedeu São Pedro !
Lá foi o Grande Líder Espiritual em mais uma de suas viagens !
Mais uma jornada, agora para junto ao Pai e continuar sua missão!
Papa João Paulo II parte deixando seu rebanho terrestre
Para continuar em outro plano, novos rebanhos pastorear e
cumprir sua tarefa de pacificador, de Guia Espiritual ,
de mediador e de intercessor junto ao Nosso Pai Celestial.
Nosso Mestre Espiritual nos legou uma grande lição
a de que viajar é preciso ... para buscar as ovelhas
que por algum motivo desgarraram-se do rebanho e
trazê-las de volta para a casa paterna.
Hoje podemos ver nos quatro cantos da Terra
a gratidão e o reconhecimento ao nosso Guia ;
cristãos de todas as igrejas rendem homenagem ao Santo Padre
que soube guiar seu rebanho com amor !
João Paulo II humildemente pediu perdão
aos que um dia em nome da Santa Igreja e
da política inquiridora da época foram discriminados e
muitas vezes ceifados de seus direitos.
Com sua sabedoria, o Papa quis demonstrar seu amor a todos.

Adauto Neves

Meu Encontro com Mojica



Era início da década de sessenta.
Meus pais acabavam de retornar para São Paulo depois de quase 10 anos em Minas Gerais.
Era um garoto da roça, conhecia sim o mundo do campo, os rios, as florestas, os pássaros, enfim a natureza! A vida simples e maravilhosa do campo.
Filho de família religiosa, católica, logo minha mãe procurou colocar-me no colégio das freiras, o Externato Nossa Senhora do Sagrado Coração e logo incentivou-me a ingressar no grupo de coroinhas do Santuário do Sagrado Coração, em Vila Formosa, São Paulo.
Meus dias passaram a ser no Externato e na Igreja sobrando pouco tempo para ficar em casa!
Participava ativamente de todas as celebrações de domingo a domingo.
Logo conquistei a confiança e a proteção da Madre Superiora e do Vigário além da atenção especial do Irmão Afonso que era o responsável pelos coroinhas.
Atuava nas apresentações religiosa tendo representado o menino Jesus aos doze anos e outras crianças bíblicas.
Certo dia ao chegar, como de costume, antes da missa das sete, o irmão Afonso destacou-me a ajudar a missa de um visitante que estava hospedado na Casa Paroquial. Lá fui eu. Como a missa era em Latim mal percebi a origem do Padre. Apenas sabia que era de outra Ordem, pois usava hábito de monge e não dos Missionários do Sagrado Coração.
Foi depois de ter me despedido daquele Monge, dias depois que o Irmão Afonso contou-me quem era o ilustre visitante.
Contou-me que ele havia sido um cantor muito famoso na Espanha e que depois do auge de sua carreira ele resolveu abandonar a carreira artística e tornar-se um monge.
E que uma de suas músicas mais conhecidas era o "Jura-me" ... mal pude conter meu espanto!
Jura-me era uma canção que minha mãe falava sempre e quando chegamos em São Paulo ela pediu para o meu pai procurar um disco que tivesse essa música.
Corri para casa e quase sem fôlego... contei para a minha mãe o ocorrido dias atrás.
Mas o Monge já havia partido e até hoje só ficou a lembrança de que "eu conheci Frei Mojica" o autor de Jura-me !
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"JOSÉ MOJICA pode ser apontado como um dos grandes artistas latinos do século. Através dos discos, filmes e apresentações pessoais, sua arte de cantor e figura de galã foram levadas a todas as partes do mundo. Depois que se tornou sacerdote-cantor, acrescentaria a essa fama e admiração o respeito pelos seus predicados humanos. Nasceu José Mojica, em 14.9.1896, na cidade de San Miguel, Estado de Jalisco, no México, com um nome extenso: Cresenciano Abel Exaltación de la Santa Cruz de Jesus Mojica Montenegro y Chavarín. Só quando se fez adulto, sua mãe, D. Virgínia Montenegro, contou-lhe que seu pai tinha sido um médico que noivara com ela e a abandonara por já ser casado e com dois filhos. De um casamento posterior, D. Virgínia teria outro filho, que faleceria bem pequeno. Não seria feliz no casamento, pois o padrasto de José, de nome Francisco e dono de oficina em que fabricava sapatos, demonstrou ser um homem extremamente violento, por causa disso condenado a alguns anos de prisão, não mais voltando ao convívio da família depois de libertado. Mulher tenaz e muito religiosa, D. Virgínia incutia em José os ensinamentos e a fé católicos. Um dia, sentindo o desprezo da gente do local, decide deixar San Miguel para tentar melhor sorte na capital mexicana. Vende por pouco dinheiro as propriedades que ainda possuía e toma com José o trem para a Cidade do México. Era 1906. Na capital matricula-o no Colégio Santa Maria e a seguir numa escola pública. Vivem os dois uma existência bem modesta com alguns episódios desagradáveis, como aquele em que, em suas ausências, ladrões despojam de tudo a casinha em que habitavam. Para que possam sobreviver, trabalha como costureira e utiliza-se das reservas trazidas. José continuaria seus estudos na Escola Nacional de Agricultura, fechada durante os acontecimentos da revolução de 1910. Como estudante deixa-se envolver pela política, tendo corrido sério risco de morte no momento em que os revolucionários chegam à capital. Ao mesmo tempo em que cursa agricultura, estuda piano e pintura. Não lhe passa pela cabeça a idéia de cantar. Confessaria mais tarde que "nunca tive e nem tenho paixão pelo canto. Tinha sim, e tenho, paixão e vocação para a pintura. Fui cantor famoso, mas nunca pude encontrar tempo para pintar. O cultivo da arte é absorvente. Em quaisquer de suas manifestações, o homem é limitado e Deus o leva sempre para onde convém mais." De certa feita em que estudava solfejo no Conservatório, os alunos são convidados a participar dos corais de uma nova companhia de ópera que se estava formando no Teatro Ideal. Quando são perguntados se desejam fazer um teste de voz, levanta a mão apenas por levantar. Ao saber que tinha voz de tenor sente uma estranha sensação. Sua mãe fica contra essa ameaça de mudança na direção dos planos traçados para ele, mas José argumenta que era uma oportunidade de ganhar algum dinheiro. A conselho da mãe concorda em tomar lições de canto para ter a certeza de que de fato tinha talento. É o que faz durante certo tempo, até se apresentar na companhia, não mais como pretendente a um lugar no corpo coral, mas como solista de pequenos papéis. Suas qualidade potenciais são reconhecidas pelo célebre maestro mexicano Cuevas, que se oferece para ministrar-lhe aulas. O progresso de Mojica evidencia-se cada vez mais, tanto que passa a primeiro tenor. A escola de Agricultura, que reiniciara as aulas, perdia definitivamente um aluno. Em busca da fama e da fortuna, parte em 1916 para Nova Iorque, integrando um conjunto formado por Carmen Garcia Cornejo, soprano, Angel Esquivel, barítono, e Julio Peimbert, pianista, sendo empresariados por Maria Grever, notável compositora mexicana de futuro renome mundial. O resultado da aventura é desanimador, dada a falta de oportunidades. Mojica termina por lavar pratos durante meses num restaurante. Mesmo assim é ouvido a cantar no trabalho trechos de óperas, com isso vindo a receber aulas de uma senhora chamada Blackman. Quando sua triste e desalentadora situação parecia não ter nenhuma saída, afortunadamente é convidado a se juntar a uma grande companhia de óperas em vias de ser montada em sua pátria. Da noite para o dia vê-se ao lado de nomes célebres da cena lírica mundial. Daí em diante sua ascensão gradativa não teria percalços ou descontinuidade. Terminada a temporada, começa outra com a presença do maior astro do bel-canto mundial, Enrico Caruso, do qual se torna bom companheiro. No final de 1919, volta aos Estados Unidos numa situação bem diferente da primeira vez, pois contratado pela Chicago Opera Company. Além dos rendimentos cada vez maiores no palco, tem a oportunidade de gravar seus primeiros discos na Odeon. Conhece então pessoalmente Thomas Alva Edison, uma das maiores admirações de sua vida, a quem pede uma foto com dedicatória. Edison conta-lhe que todas as noites antes de dormir ouvia sua gravação de Golondrina Mensajera e o imaginara um cantor de meia-idade, não tão jovem. Mojica por sua vez não se refere ao fato de que, em sua primeira estada nos Estados Unidos, tinha sido recusado pela Odeon americana depois de teste de gravação examinado pelo próprio Edison. A partir desse contato, Mojica vai alternando concertos nos Estados Unidos e México. Enquanto sua carreira profissional ia cada vez melhor, dando-lhe condições de proporcionar toda a assistência e conforto à sua amada mãe, com qual sempre morou, sua alma continuava inquieta na busca da verdade. Vinha procurando explicações em novas filosofias e religiões e tinha períodos de agnosticismo. Por fim, volta à fé católica pelo caminho de uma devoção particular a São Francisco de Assis, o santo dos pobres. Tal decisão se dá quando estava com 27 anos, exatamente numa visita à escola franciscana de Quincy, cidade do Illionois. Em 1929 é convidado pela Fox para trabalhar em Hollywood em filmes falados e cantados em espanhol, pois, além de ter voz, encarnava o tipo ideal do galã latino exigido pelos roteiros melodramáticos. Assim é o astro de O Preço de Um Beijo, em duas versões, um extraordinário sucesso em diversos países de língua espanhola, inclusive a Espanha, embora mais uma vez a crítica de seu país tenha se mostrado contrária, como sempre fazia em relação aos artistas mexicanos que atuavam no cinema americano. No seu caso não aceitavam que, cantor consagrado de óperas, descesse para cantar simples canções populares. Outros filmes se seguiriam, como Príncipe, Rei dos Ciganos, A Cruz e a Espada, As fronteira do Amor, A Canção do Milagre e outros, neste último no papel de um sacerdote católico, numa antecipação do que faria mais tarde. Seus discos então se vendiam como nunca. Muito de seus êxitos são até hoje páginas clássicas. Cada uma de suas apresentações na América Latina, Europa e Norte da África consituia-se em consagração. Nada deste mundo lhe faltava, mas no seu espírito continuava um vazio, que só uma completa dedicação a Deus haveria de preencher. Em 1941 estava filmando na Argentina, em Buenos Aires, Melodias da América, quando recebe a notícia do falecimento de sua mãe. Decide então entrar para o convento franciscano de Recoleta, na cidade de Cuzco, no Peru, que já conhecia. Dá um último concerto e viaja para o México a fim de distribuir sua fortuna. Em 1942 recolhe-se à clausura e no ano seguinte recebe as ordens menores. Em 1946 ;é ordenado padre, adotando o nome de Frei José Francisco de Guadalupe. Sentindo que ainda poderia com sua arte e fama obter recursos para obras de caridade e divulgar a religião, consegue de seus superiores autorização para apresentar-se cantando músicas profanas. É o que passa a fazer em novas excursões pelo mundo e em filmes, sempre porém vestindo o hábito de frei franciscano. Já tinha visitado o Brasil em 1937 e cantado no Cassino da Urca. Volta em 1942 e 1950, quando participa da inauguração da primeira estação de televisão brasileira, a TV-Tupi de São Paulo. Retorna em 1955 - reza uma missa em intenção da alma de Carmen Miranda - 1964 e 1967. Por causa de problemas circulatórios que afetara sua perna direita, vem a falecer na idade de 78 anos, em 20.9.1974, na cidade de Lima, no Peru. Abel Cardoso Junior. O texto acima não representa a biografia completa do artista, mas sim, partes importantes de sua vida e carreira. "

A VELHA PRAÇA

Na mesma praça que hoje abriga a Velha e a Nova Matriz brincou a geração de meu pai e a minha.
Durante a semana brincávamos afoitos na parte que ia da Velha Matriz a Caixa D'Água. Havia um parquinho público, com balanços, escorregadores, gangorras e gaiolas onde nos divertíamos muito. Brincava mais com meus primos, primas e alguns amiguinhos que encontrava quando estava na cidade.
Mas por ora vou me ater a apenas alguns fatos marcantes que fixaram em minha memória.
Quando nos preparávamos para ir para a cidade nos finais de semana minha vó falava:
- menino, pega umas laranjas, peras, maçãs para você vender na cidade e ganhar algum dinheiro para você comprar picolés, e ir ao cinema...
Seguindo a orientação de minha vó, preparava uma cesta com lindas frutas e colocava no Jipe.
Chegando a cidade ia (meio sem jeito) de casa em casa oferecendo as frutas que eu apanhara. Normalmente eu as vendia logo e arrecadava algum dinheiro para meu final de semana.
Certa vez após percorrer algumas casas, parei na praça para descansar um pouco e fiquei a olhar alguns garotos que brincavam quando um deles aproximou-se de mim e furtou uma maçã de minha cesta sem pagar saindo correndo.
Senti-me indefeso, pois ele era maior que eu e ainda estava acompanhado de outros colegas.
Olhei num banco da praça e vi um jovem fardado, sabia, era um soldado. Corri em sua direção e falei do ocorrido. Mostrei o garoto que ainda comia a maçã furtada.
_ menino, não sou daqui, nada posso fazer - respondeu-me o jovem soldado com ar de desinteresse.
Desapontado, fui para casa levando o restante das frutas interrompendo a venda.
Ah da Velha Matriz muitas lembranças das Semana Santas, das Procissões, do Catecismo, dos padres holandeses...
Quando entrava com meus pais nas festas em que as crianças se vestiam de anjos, eu... passando diante da escadaria, na lateral interna da igreja, olhava aquelas criaturas...imaginava que fosse realmente anjos em carne e osso... só alguns anos mais tarde eu percebi que se tratava de crianças vestidas de anjos prontas para uma representação.
O casamento da Tia Gabriela foi marcante, aquela festa toda... depois a entrada dos noivos naquele carro preto, brilhando... era acho que o primeiro casamento que eu assistia, fiquei maravilhado!
Em 1954, na tarde de 24 de agosto... estava eu, minha mãe e minha avó passando diante da Velha Matriz, quando a tia Ritinha, (cunhada da minha Avó) interrompeu nossa caminhada chamando:
- (tia Ritinha) Anita ! Olha, deu no rádio agora mataram Getúlio Vargas.
- (vó Anita) Nossa, como foi isso?
- (mamãe) Nossa, meu Deus!
- (tia Ritinha) é... ainda não sabem como tudo aconteceu, acabaram de encontrá-lo morto com um tiro.
24 de agosto de 1954 (morte de Getúlio Vargas)

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Eu, com meus quatro anos de idade ... tive uma verdadeira reviravolta em minha cabeça e o medo tomou conta de meus pensamentos.
Eu não sabia, não entendia bem... pensava que o crime havia sido cometido ali mesmo na cidade, dai o medo que tomou conta de mim naquela tarde e a imaginação tomou asas...
Mas o tempo passou... mais tarde entendi aquele momento na Praça quando soube da morte de Getúlio Vargas.
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Creio que do Planalto que abriga esta grande área verde onde se localiza a Velha e a Nova Matriz é que se originou o nome da cidade, quando a senhora portuguesa, chamada Catarina Parreira chegou exclamou:- Ah que campos belos !!!Dai veio mais tarde o nome de Campo Belo.Se quiser saber um pouco da história pode ver documento sobre a Origem de Campo Belo segundo o estoriador Edson Ribeiro.
A MAIOR PRAÇA DO MUNDO

A velha Caixa D'água

Na cabeceira da Praça que hoje chama-se Praça Menoti D'Aura havia até final da década de 50 uma velha Caixa D'Água. Era uma torre de mais ou menos 8 ou 10 metros . O reservatório era sustentado por quatro pés de ferro e havia um emaranhado de canos de ferro que distribuía a água para acidade.
O local era aberto, não havia a Praça, apenas uma faixa de terreno que abrigava a velha matriz que ficava abaixo, no meio, e depois sim já havia a outra Praça mais antiga.
O local da Caixa D'Água era como que um pouco de encontro, pois era ali que as pessoas esperavam a jardineira*, o caminhão ou a carona para retornar a roça, ao campo.
Gostava de ficar ali brincando, vendo os meninos com seus papagaios (pipas) coloridos, e observando o pequeno movimento das pessoas por ali.
De um lado havia a velha casa da minha bisavó, a mãe-vó, bem em frente a casa do tio Leonardo e do outro lado na esquina da rua da Cava o velho armazém Souza. Olhando-se para baixo, deparava-se com o fundo da velha Matriz que ficava entre o Colégio Dom Cabral de um lado e do outro o Colégio São José e a Casa Paroquial.
Como não havia ainda a Praça, o espaço que havia entre a Caixa D' Água e a velha Matriz era usado frequentemente para receber grandes Circos, como o Circo Norte Americano, Circo de Moscou, Circo de Napoli entre outros.
Circo na cidade era uma grande festa, a propaganda era feita com um grande desfile pelas ruas da cidade, grandes caminhões levavam os animais selvagens em jaulas e em carros menores iam os alegres palhaços e o carro do som anunciando o espetáculo e distribuindo panfletos!
Lembro-me de dois espetáculos, um por volta de 1954, queria ir ao Gran Circo Norte Americano e não tinha dinheiro, depois de muito insistir, lembro-me que minha Avó foi pedir para a mãe dela, a Mãe-Vó, dinheiro para o meu ingresso... lembro-me bem que a minha bisavó foi nos seus guardados e pegou umas moedas, não sei o valor hoje, mas sei que ela disse, olha vou pegar esse dinheiro do Diogo para você ir. Fui, acho que com a minha avó Anita e minha mãe. Era um drama, O Direito de Nascer. Apesar de não entender bem a estória na época, lembro que muito me comoveu! Ainda consigo lembrar da Mamãe Dolores, de sua voz, de sua feição...
Durante o dia, minha mãe, minha tia e outras mulheres ficavam a espreita para trocar alguma conversa com as atrizes que circulavam tranquilamente pela cidade.
Outro espetáculo, foi mais tarde, creio que por volta de 1955 ou 1955, pois meu avô já havia comprado a casa da Rua Antonio Modesto, no número 66, centro. Havia um Circo, o nome não me recordo, estava instalado próximo a Estação Ferroviária, como eu queria ir.. minha mãe conversou com um casal que morava próximo a nossa casa, devia ser conhecidos de meus pais. Acho que foi a primeira vez que sai com estranhos. Fui com eles, era noite, o espetáculo terminou tarde mas gostei muito do espetáculo. Este, não era show dramático, era show com animais, tigres, leões, panteras negras, elefantes, e saltitantes bailarinas, trapezistas, alegres palhaços e um animado time jogadores de futebol formado apenas por cães adestrados. Nossa, que mundo maravilhoso e encantado aquele mundo circense!

A Casa onde Nasci !

O nome da rua ... não me lembro mas da rua, da casa, da vista que eu tinha da janela do quarto, da varanda...ah ainda está muito nítida em minha memória!
A casa ainda existe, aparentemente continua da mesma forma...
A rua é uma rua de subida, fica na saída da cidade, do lado sul, antiga saída para Aguanil, Porto dos Mendes, Boa Esperança.
Lembro-me dos caminhões que subiam a rua com seus motores cansados exalando aquela fumaça preta do diesel. Gostava de sentir aquele cheiro no ar, era algo diferente do campo... Além dos poucos caminhões que subiam a rua, durante o dia, passava além dos leiteiros em seus cavalos carregados de leite que era vendido de casa em casa... gostava do apito das carroças, da corneta anunciando a venda de picolés, ou de pães...
Ah quanta saudade vem na lembrança daquela primeira casa que me acolheu!
Lembro-me dos meus primeiros banhos que eram disputados pelas primas da minha mãe, (o nome delas não me recordo, apenas de como eram) e por minhas tias.
Não era nenhuma banheira dessas coloridas... era uma bacia de zinco colocada em cima de um suporte, não sei, mas acho que era um banquinho de madeira... mas era um banho delicioso, isso lembro muito bem!
A casa, por dentro, não era muito alegre não, achava um tanto escura, o quintal nos fundos da cozinha, era um misto de mato e canteiros com alguma verdura. Meus avós moravam na fazenda, a casa da cidade era apenas para os finais de semana quando todos vinham da roça, da fazenda.
Além das lembranças vivas já citadas, lembro-me de uma vez ao entrar no quarto ver meu pai chorando, não lembro ao certo se era devido a situação que passava nos primeiros anos de casamento, o meu nascimento que trouxe meus pais a casa de meus avós ou se meu pai estava doente, não sei ao certo. Sei que logo depois desse dia, soube que ele e minha mãe iriam para o Rio em visita ao meu tio Antonio, padre que morava no Rio de Janeiro. Lembro que fiquei sem nenhum problema com meus avós e com minha tia Gabriela que eu não me separava nunca!
Mas logo meus pais estavam de volta. Vieram com muitas estórias que eu ouvia atento!
Falavam da visita a um Navio de grande porte que meu tio levou-os para visitar... minha mãe falava como era grande por dentro, do mar imenso... narravam os passeios feitos ao Pão de Açúcar, a Quinta da Boa Vista, às praias e ao Palácio do Catete. Eram muitas estórias que me encantavam e sempre que as repetia para outras pessoas eu ficava atento para ouvir de novo!
Uma outra imagem forte que guardo foi a saída de um cortejo funerário saído de uma casa que ficava do outro lado de casa, um pouco mais abaixo. Lembro que acompanhei minha mãe e minha avó até a mureta do jardim e ficamos vendo a saída do cortejo, sei que era um caixão roxo com alças douradas. Fiquei a olhar aquela cena até sair rua acima e desaparecer rumo ao cemitério paroquial.
Pouco tempo depois, antes que eu completasse dois aninhos, a casa foi vendida e meu avô mudou para a Fazenda da Mata, só comprando outra casa na cidade anos mais tarde.
Neste período a nossa ida para a cidade ficava na casa da minha bisavó, a mãe vó, casa do tio Juarez e algumas vezes na casa da tia Dolores.
Eu não gostava muito, pois mesmo na minha inocência, eu já não me sentia em casa, era meio estranho, incômodo apesar de ser muito bem tratado e querido pelos tios e primos !
Essas são algumas das minhas memórias de infância, da mais tenra infância! Da casa onde nasci! Até da parteira, a "Sinh'ana" na época freqüentava mais amiúde esta casa!
São doces memórias!

Vivências Sutis

Meus pais moravam em São Paulo, mas minha mãe voltou para Campo Belo, MG, cidade natal, quando eu estava para nascer. Depois de certo tempo, passado toda aquela euforia do primeiro filho, do primeiro neto, o segundo sobrinho. Mamãe já estava mais acostumada com a nova situação de mãe, voltou para São Paulo, onde meu pai trabalhava. Voltávamos a casa dos avós sempre no fim de ano. Lembro-me que viajávamos por dois dias, pernoitávamos em Cruzeiro, SP para seguir viagem no dia seguinte. Era apenas um neném, mas lembro-me do local onde ficávamos, parece que era um hotel popular, pois o cheiro do banheiro era sensível. Durante a cansativa viagem de trem, a Maria Fumaça eu lembro perfeitamente das fagulhas que saiam da chaminé da locomotiva e entrava pela janela daquele vagão de madeira. Mas ficava bem curioso de observar tudo, paisagem, movimentação de pessoas... Lembro-me numa dessas viagens, parece que foi numa das voltas a São Paulo, encantei com uma menininha mais velha que eu que me fazia rir muito com suas gracinhas. Antes de completar dois aninhos, lembro-me que meu pai resolveu mudar de vez para Minas e confesso fiquei muito feliz. Chegamos em Minas - meu avô já havia vendido aquela casa em que eu nascera, por isso ficávamos, na cidade, na maioria das vezes na casa da tia Dolores, ora na casa da Mãe Vó (a minha bisavó materna). Morávamos mesmo com meus avós maternos na fazenda que não sei o nome, pois lá ficamos pouco tempo, logo meu avô comprou outra fazenda que foi de meu bisavô um pouco mais adiante, e bem maior. A Fazenda São João, e a anterior só me lembro de sempre se referirem a ela como a Fazenda do Eurico, lembro sim de lá, da casa, dos cômodos, que eram um pouco escuros, acho que por causa das árvores frondosas que haviam em volta da sede e por isso entrava pouca luz nos cômodos. Recordo-me do açude que tia Gabriela nadava e me levava sempre e lembro-me da casinha onde a Jane, o Tonho e outras crianças maiores brincavam de casinha com a tia Gabriela; era no meio do pomar rodeada de laranjeiras. Há muitas passagens na lembrança desta fazenda, que serão narradas em outras narrativas. A mudança aconteceu de repente, fui dar conta no dia em que meu avô chegou comigo no colo, e diante daquele casarão enorme, olhando e mostrando-me aquelas janelas enormes disse: - " filho isso aqui um dia será tudo seu! " Não entendi as palavras naquela hora, entendi que era ali que iria viver. Os primeiros dias eu chegava a me perder naquela casa, no corredor, nos cômodos e aos poucos fui me acostumando e adorando aquela fazenda. Tudo era muito alegre, muito movimento e uma vista que não havia na outra casa. Os empregados, o velho Alexandre, a Mariana, a Dorva, o Izé, todos vieram se juntar a outros que já trabalhavam na fazenda. Com essas pessoas conhecidas e familiares tornou minha adaptação mais fácil e aproveitei os anos que seguiram até seguirmos para o sitio no Morro Grande. Dos dois aos 9 anos com freqüência experimentei algo que eu mal conseguia entender e jamais comentar com quem quer que fosse! Sabia que jamais acreditariam em mim! Passei boa parte de minha infância no campo, na fazenda de meus avós, na Mata da Caatinga, município de Campo Belo e em nosso sítio do Morro Grande, no distrito de Porto dos Mendes próximo às margens do velho Rio Grande. Não possuía amigos da minha idade, crianças além dos irmãos menores e os primos que encontrava na cidade nas épocas de festas como Semana Santa, Páscoa, Natal e em outros encontros familiares. Passava maior parte de meu tempo nos arredores da fazenda, ou do nosso sítio, caminhando por ali e por acolá. Sempre que podia me juntava aos mais velhos para ouvir as estórias dos antigos! Costumava sentar-me ao pé de um frondoso Ipê amarelo que ficava na porteira em frente a sede, ou me retirava para uma laje de pedra bruta que ficava no alto de uma serra, de onde contemplava todos arredores. Muitas vezes, me vi numa situação fora de meu controle. Não sei como, saia voando sobre a sede, o pomar, os cafezais, e meio sem saber... e sem entender como ... eu aproveitava aqueles instantes, sentindo-me deslizar suavemente pelo ar como os pássaros. Era uma sensação maravilhosa, confesso... mas assustadora! Eu sabia não ser uma habilidade normal e passível de entendimento e compreensão. Por isso jamais compartilhei com ninguém tais experiências! Confesso, não era uma situação totalmente sobre meu controle, não acontecia sempre quando eu queria, as vezes me deparava com a situação quando menos esperava, mas aprendi logo a aproveitar esses momentos, pois eu sabia de algum modo não eram comuns. Sentia deslizar pelo ar, vendo de cima aquela pastagem verde sob meus olhos, o gado espalhado pela colina parecia ser pequenas peças de brinquedo, tinha uma visão de todo o pomar matizado de pontos amarelos, dos frutos, entre as diversas tonalidades de verde. Observava serpenteando sob as árvores atravessando o fundo da fazenda o córrego que abastecia a casa sede e a dos empregados. Mas eu não ousava sair das imediações... era uma situação fantástica mas um tanto aterrorizante pois não tinha o controle total que com certeza os pássaros possuem. Só me lembro que com um simples esforço de meus braços e pernas esticadas eu conseguia subir, descer e mudar de direção. Mas de repente, as coisas foram mudando, meus pais começaram a se preocupar com o meu crescimento, a necessidade de mandar-me para a escola, e de uma hora para outra descobri que estávamos para mudar para São Paulo. Era uma grande mudança, mas sabia que ia poder freqüentar escolas e tantas outras coisa que eu já arquitetava em meus sonhos... Sabia que de certo modo que eu deixaria o meu mundo para trás e sabia que isso não seria fácil.O tempo foi passando, cresci, amadureci, e nas minhas leituras e busca de conhecimento aprendi um pouco sobre xamanismo, os estados alterados de consciência, as experiências fora do corpo, e as outras dimensões... Depois de muito tempo, há alguns anos atrás pude reviver tal emoção de “voar” saindo de meu corpo conscientemente, como na infância, porém com uma duração menor, não consegui ir muito longe e retornei. Jamais declarei tal experiência, somente agora revelo tais registros antes trancados em minha memória. Atualmente, essa é uma experiência de sair do corpo pode ser vivenciada conscientemente. Apesar de ser sabido que todos nós, durante o sono, costumamos sair do corpo e visitar outros lugares inconscientemente. Porém é raro nos lembrar disso a não ser, às vezes, como um sonho que tivemos. Atualmente há profissionais que utilizam técnicas que ajudam as pessoas a vivenciar experiência assim conscientemente.
(*Lembre-se que as experiências que uma pessoa vive nunca terão o mesmo valor para as demais pessoas, só para quem realmente a vive, mas em todo caso ousei tirar do fundo do baú tais lembranças.)

Hoje eu queria...


Hoje eu queria dizer... ... senti vontade de escrever... mesmo que ninguém venha a ler este "post" mas quero mesmo assim estrapolar um pouco do que guardo em meu peito:

saudade...; de tudo aquilo que não foi...
alegrias...; por estar vivo e com saúde...
sonhos...; que ainda ouso sonhar ...
tristezas...; dos momentos de desencontros ...
espectativas...; daquilo que ainda está por acontecer ...
conquistas...; de tudo que almejo e hei de conquistar ainda...
ganhos...; os frutos que tenho por colher
perdas...; consequência de nossos erros ... ou mero destino (?) ...
revolta...; das injustiças sociais, ao nosso redor, no Planeta...
resignação...; pelas coisas que não podem ser mudadas ...
decepções...; dos desafetos, dos desamores, dos demandos políticos...
esperança...; de um amanhã melhor que hoje ...
"Tomorrow will be wonderfull"

A ESCRITA

Eis uma coisa que depende de coragem... de despreendimento...
Pois escrever... é desnudar-se, despir-se, tirar a nossa casca... mostrar-nos como realmente somos.
Ao escrever estamos colocando o nosso pensamento a disposição do mundo todo...
pois escrever e engavetar os escritos é o mesmo que perder tempo, o mesmo de abortar um rebento.
Escrever é ousar, ser diferente, expor-se ao mundo.
A palavra uma vez proferida (mesmo que escrita) é como uma flecha que lançada, não sabemos onde vai parar.
E para escrever, antes pensamos e ao pensarmos geramos ondas invisíveis que viajam para lugares jamais imaginados...
Hoje com a Internet isso se torna mais fácil ainda.
Já pensaram nisso!?
Adauto Neves

Libertas quae sera tamem


A humanidade inventou mecanismos para dominar as mentes e desviar os seres humanos de seu trajeto original!
No Princípio o homem era livre e senhor de si...
Então começou a criar normas, regras, e impor verdades e continua até os dias de hoje...
Cada vez mais restringindo a verdadeira liberdade dele próprio.
Hoje, está reduzido a números, senhas e a uma série de convenções que obriga cada pessoa viver de acordo com os interesses da classe dominante!
Os seres mais primitivos ainda são livres, não estão sujeitos a normas, a convenções... Vivem segundo seu instinto, seu desejo, livre e quando sentem a presença humana, fogem para não perder a liberdade original. Vejam só os animais e mesmo as tribos mais primitivas são ainda livres, vivem mais junto à natureza e mais felizes.
Outrora, fez se dos mais fracos escravos para servir os mais poderosos.
A escravidão acabou.
Acabou?
Não, apenas mudou se a forma de escravidão...
Hoje a maioria dos seres humanos vive submissos a uma escravidão maior!
Observem, nascem e são confinados a um carrinho, a um berço com grades, depois para aprender a andar são colocados num andador com cinto de segurança que mal podem se mexer. Depois, leva-se para uma escola, onde recebem uma série de regras a seguir, horários rígidos. Em casa, têm que ter horário para sair e voltar. Horário de comer, tomar banho, e de dormir e levantar, ... o pior... acordar cedo!
Mais tarde, encontra alguém que gosta e ai começa um ritual de pedir permissão, obedecer a horário e muitas outras coisas.
Ao resolver casar, pensa em liberdade, ter a própria casa, não estar mais sobre a submissão dos pais... engana-se mais uma vez!
Começa então uma outra forma de reclusão, fica preso um ao outro.
Cobra e é cobrado de horários, atitudes e outras coisas mais!
De submisso passa também de opressor, quando os filhos chegam ai o papel de opressor aumenta mais ainda sobre eles!
Que liberdade é essa?
Vive-se sob regras impostas por uma sociedade, são eternos escravos de um grupo, de interesses coletivos, de um governo, de uma religião!
O Homem foi livre um dia?
Voltará o homem a ser livre um dia?
O que é a liberdade para você?
Adauto Neves

MEUS ESCRITOS

Escrever é um fascínio que me atrai desde a tenra infância... sempre rabisquei meus escritos, mas nem sempre os guardava, achava que não eram bons e os jogava fora.Desde meus doze anos tinha vontade de escrever, escrevia minhas narrativas sobre minha infância, sobre coisas e lugares que eu gostava.Lembro-me que guardei um rascunho por décadas de uma estória que estava escrevendo sobre um cachorro chamado Norte, um velho amigo da infância que morreu mordido por uma cobra venenosa. Acabei um dia desinteressando-me pela narrativa e jogando todo rascunho no lixo.Vasculhando minhas mais tenras lembranças, encontro velho sonho de um dia ser escritor, escrever livros que pudesse encantar as pessoas assim como os muitos que me fizeram viajar além do tempo, além de minha cidade.Durante toda minha carreira no magistério, sempre incentivei meus alunos ao mundo mágico da escrita, promovia a escrita, a leitura aos meus alunos, desde as crianças aos mais maduros.O meu sonho de escrever foi ficando apenas na lembrança, ora escrevia alguns versos para alguém, ora alguns textos, mas não me apegava a eles e apenas alguns ficaram em rascunhos que guardei até publicar aqui no meu Site.Hoje, penso em dedicar mais tempo a escrever, principalmente as minhas lembranças, as minhas vivências, os meus sonhos...Escrever um livro, quiçá um dia! Mas enquanto não sai de um sonho meus escritos ao invés de ficar engavetados e depois ser jogados ao lixo editei-os na Morada dos Sonhos e daqui jamais saberei até onde irão.Para quem quiser aventurar-se a leitura de meus escritos.. que muitas vezes vão além deste nosso mundo de realidades... esteja a vontade e navegue pelo menu ou sub-menu na lateral direita.
Críticas ou Sugestões serão sempre bem vindas.
A.N.

O PODER DA PALAVRA


Lembre-se: aquilo que se traduz em palavras vem na realidade a se manifestar. Conscientize-se que as palavras têm poder criador e as utilize sabiamente.
A palavra tem força criadora, segundo o escritor intelectual Lourenço Prado que nos dá uma aula sobre o poder da palavra. Diz ele: Se conhecêsseis o poder de vossas palavras, teríeis grande cuidado nas vossas escritas e conversas. Bastar-vos-á observardes a reação de vossas palavras para verificardes que elas não voltam vazias . Por meio das palavras que escreveis ou pronunciais, estais estabelecendo continuamente leis para vós mesmos. As forças invisíveis agem sempre a favor daquele que está continua e corajosamente avançando para a frente, embora não o saiba. Em virtude das forças vibratórias das palavras, quando o indivíduo escreve ou fala alguma coisa, começa a atraí-la para si.
Cada palavra que expressais, exerce uma ação na vossa vida pessoal, a qual será a vosso favor ou contra vós, conforme a idéia expressa pela palavra. Com efeito, cada palavra que emitirdes (da forma que for) é uma expressão, a qual produz uma tendência particular em determinada parte de vossa entidade. Essa tendência pode manifestar-se em vossa mente, no vosso corpo, na vida química deste último, no plano dos desejos, no caráter, em qualquer de vossas faculdades, vindo em seguida, a produzir seus efeitos materiais.
Extraido do Jornal NOVO TEMPO

Poeta


“O poeta é um fingidor,
finge tão completamente,
que chega a fingir que é dor,
a dor que deveras sente.”
Fernando Pessoa

CORUJA

CORUJA
Meu elemento xamânico.